Agostinho José de Azevedo aparece na nossa grande árvore genealógica como parte do mesmo tronco familiar a que pertencemos.
Transcorria o ano de 1734 quando o Santo Ofício de Lisboa, uma espécie de supremo tribunal da Inquisição que julgava denúncias contra indivíduos que, às claras ou clandestinamente, praticassem atos religiosos contrários ao catolicismo, expediu uma intimação às autoridades do Rio de Janeiro para que prendessem Agostinho. Ele era acusado de judaísmo, embora em segredo. Alegando dificuldades, Agostinho conseguiu adiar sua transferência para Portugal até 1742, ano em que foi sentenciado.
Era o auge da perseguição que a Igreja movia na Península Ibérica contra as numerosas comunidades de judeus e árabes que se estabeleceram na região desde fins do primeiro milênio. Elas exerciam grande poder econômico e forte influência cultural e científica. Devem os Descobridores portugueses e espanhóis os sucessos que, séculos depois, obtiveram nas suas grandes navegações e conquistas territoriais ao conhecimento de matemática, astrologia, astronomia, geografia acumulados por árabes e judeus que se estabeleceram na Península.
Agostinho foi levado preso a Lisboa para ser submetido ao julgamento eclesiástico em 1741. Ele tinha, então, cerca de 40 anos. Há dúvidas quanto à sua nacionalidade – se português nascido no arcebispado de Braga (região do Minho, no norte do país) ou se já brasileiro no Rio de Janeiro. Era filho do judeu Joseph Correa Ximenes e da cristã-velha Guiomar Azevedo. Na ocasião morava com a família no Sul de Minas Gerais, freguesia de Campanha, na mesma onde se estabeleceu grande parte dos nossos primevos Azevedos. Casou-se em 1739 com Maria Ritta do Prado, 20 anos mais nova que ele. Tiveram nove filhos, o primeiro em 1740 e daí em diante a partir de 1742.
No século 18, a região era rica em minas de ouro e pedras preciosas e Agostinho certamente devia a essa atividade a prosperidade econômica que usufruía. Não que fosse explorador de minas ou garimpeiro; ele se declarava comerciante e “tratante” – pessoa que se encarregava de cuidar da logística e da arregimentação de trabalhadores (inclusive índios e escravizados negros) para as minas de ouro.
A intimação do Santo Ofício o descrevia como cristão-novo (isto é, judeu supostamente convertido), casado. Ao final do julgamento, foi sentenciado a cumprir cárcere e a usar hábito penitencial, roupa difamatória usada até o fim da vida para identificar a condição de judeu e a profissão religiosa, penas que se estendiam à família. Teve também seus bens confiscados. O processo está arquivado na Torre do Tombo, Lisboa, sob número 8.670, e pode ser acessado no endereço https://digitarq.arquivos.pt/viewer?id=2308792.
Submetido a um “auto de fé”, cerimônia pública a que eram submetidos os hereges e ao fim da qual os acusados podiam ser condenados à fogueira, prisão perpétua ou tortura, Agostinho confessou seu judaísmo, que participava de atos de “judaísmo por volta de dez pessoas” e que, por repasse de um certo Domingos Nunes, já fazia 20 anos que “adotava a Lei de Moisés, fazia Jejuns e praticava os costumes judaicos juntamente com outros Cristãos-Novos”. Acabou convencido a abjurar do judaísmo e voltar para o catolicismo, religião na qual tinha sido batizado e crismado.
As pesquisas não deixam claro como ele conseguiu se libertar, mas voltou logo para o Brasil, talvez transcorridos uns dois anos.
Agostinho morreu em 1757 em Campanha (MG). Foi sepultado no interior da igreja matriz, “com todos os sacramentos”!